segunda-feira, 11 de abril de 2011

na roda gigante

Eu estava tremendo e suava frio como um porco. Não gostava de altura nem tampouco de muito balanço. Por razões verídicas, não sei o que me motivou a estar ali. Talvez tenha sido a Pati ter insistido à morte por aquilo. Mas eu estava lá, à fila da roda gigante, ela girava grandiosa a tocar as nuvens, e eu cá no chão, apenas a fitava medrosa.
- Droga! – pensei. A ponto que mais uma remessa de pessoas desembarcava da geringonça de metal; sorridentes e saltitantes com seus saquinhos de pipoca à mão. – Como podem ainda comer? – me perguntei. Em meu caso um vômito seria muito mais provável.
Tentei de todas maneiras contar a Pati que ia ao banheiro ou beber refrigerante, tentava disfarçar o medo da melhor maneira, morreria de vergonha se o descobrissem, eu já tinha 10 anos, e medo de roda-gigante era para bebezinhas; ela nunca percebeu meu desconforto evidente no olhar, sua atenção estava toda voltada para o que estava por vir. Senti o coração bater mais rápido que bateria de escola de samba quando o primeiro menino do último grupo ao qual antecedia o meu pisou ao chão. Todos a minha frente caminharam e minhas pernas fizeram o mesmo, contra a minha vontade. O moço vestido de palhaço apontou o meu assento, sentaria ao lado da Pati – que maravilha – baixou o ferro de proteção e travou a gaiola. Não tive mais para onde correr. Àquele momento desejei com todas as forças estar em meu quarto, jogada na cama lendo gibis, com os pés bem próximos ao chão.
O mesmo moço apertou um botão, a coisa se moveu com lentidão até pegar no tranco. Até a metade da altitude na qual o troço atingia, não olhei para baixo, em meu pensamento poderia cair se o fizesse. Chegou a um patamar de altura, logo após o frio que congelou meu estômago, em que não agüentei mais minha ansiedade. E como um vigilante em torre de penitenciária, dei minha primeira visão panorâmica. Quando me convenci de que não cairia dali, entendi todos os sorrisos bobos das outras crianças. Eu podia voar, meu corpo se encaixava de perfeito modo no ar, senti-me levitando, como no tapete de Aladin. Do alto vi não só o parque inteiro como também a minha casa e a casa da Pati, do outro lado da rua; poderia ver a cidade toda se não fosse minha precoce visão astigmática, pontinhos pretos de pessoas lá embaixo pareciam formigas aos meus olhos; o vento me corria à face e assanhava o cabelo, a boca estava seca, tão ocupada em captar todas as sensações possíveis ali, esqueci de salivar. Atentei para o mundo de novo, a Pati me cutucou o braço: - Já vamos descer, esta é a última volta – aquilo me veio como uma pancada repentina na cabeça, havia esquecido por completo, teria que abandonar os céus uma hora. Aos pés dela, lamentei minha vez ter passado e tomei o rumo de casa a passos de tartaruga.
Pus-me fora daquele lugar com muito pesar. Cheguei em casa e passei a noite a falar quão havia gostado da roda-gigante, pedi de joelhos a meu pai por um brinquedo daqueles, tolice minha, ele não recebia mais do que um salário mínimo para sustentar toda família, não poderia me dar mais do que um eventual ingresso. Chorei até me secarem as lágrimas e adormeci no sofá da sala.
Passado uns dois meses, o parque de diversões foi interditado, o proprietário não pagara os quatorze meses de aluguel atrasados, deu lugar a um desses prédios novos luxuosos, ao qual meu pai foi contratado como porteiro. Apenas tive uma chance mais de ir lá antes de isso acontecer. Dessa vez aproveitei desde a fila até a hora de descer; nunca mais esqueceria o vôo que alcei.








~narrativa que fiz pra ester ano passado. Só pra escrever mais uma folha no caderno de registros.Preciso escrever mais contos. Corriqueiro pare de me corroer. Boa noite de segunda a ninguém.

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