domingo, 28 de junho de 2015

não começo não termino
não deixo rastro
não canto não afino
não instrumento
sou

não olho não exibo
não nego não quero
me destino
não escrevo não acredito
no crivo no alvo
me estimo
não choro não separo
não acompanho
a palavra onde ela queira
eu lhe prego no desconsolo
eu lhe ensino onde estou
furtado de momento, roubado de arroubo
negarejo os lugares, lugarejo o não
o álbum de fotos, disfarce de angústia
fantasia do tempo em conter momentos
que nunca param

falhos álbuns de fotografias
nem pegaram o meu nariz entupido das rochas poeirentas, nem o dedo sem assepsia que apertou o botão
nem pior ainda
prenderam a respiração do momento morto

corre o solto dente branco, o sinal do dedo, a garatuja na parede do outro lado

o álbum me poupa do espelho
me tira o extrato e põe a cozinhar ao sol
vermelhizo até o cinza
depois branqueio as páginas por não ter pra onde ir
quando finalmente os filhos dos filhos morrerem
e eu já nem andar pelas bocas dos bichos que comem e são iguais ao seu rastro
o pó
sento e espero pelo nada
tempo
apaga

sento e espero
tempo


sento
apaga

as vozes e alaridos quase distraem
mas não incomodam
o estômago ameaça
e se cala na resposta do jantar
vou querer ovo!

sento e espero
que o papel encurte
que os assuntos voem
que as letras enfeiem
sento e espero pela primeira linha
quando a sós respirava o ar safo e parado do balão de cordas bem amarradas e
rente ao chão

sento e espero que dê em abobrinhas, é só teste, eu nunca mandei nas palavras, e não preciso de coisa alguma daqui pra trás

tiro a dobradura do papel

os cavalos escritos vão saltando e passam por cima de legumes da lista que eu preparei pra ir ao mercado
os alimentos
escassos
escassos
escassos, a bic entorna outra dose e se põe a golfar, resoluta a morrer escrevendo

eu sentado espero aquele catatau se desmanchar
prendo mais uma vez a bunda no balão e vou comer ovo

quinta-feira, 14 de maio de 2015

escrever sem saída
escrever
pondo a cabeça de fora em cada boca de lobo
escrever em cracas, perebas, corpos que moram em outros corpos
escrever
dos pingos da mucosa quando escorrem pela pele
carregando o queixo, os segundos, aquele mundo
a fome ouve longe

come todos os meus destinos

mistura todos os meus sentidos

vou por aqui

é porque nunca saí da pista

como rapina

voa e machuca o céu

vocês todos vão pra lá

todo caminho que passe

vão!vão tomar conta do seu diabo

eu sou o meu

saiam pra lá

não me olhem como um palhaço

são vocês que bebem de bandeija timbrada

armários conservas

com afetos que já foram puros

e hoje batizados em gasolina do hábito

o trajeto

a caminho do açougue

que fica na praça

e as outras casas comerciais

que vendem chaves viciadas

eu prefiro o esquecimento

confundir epitáfios e ossos

do que bater a minha escápula na sua

cuspamos tudo isso no chão

por que temos que fazer uma poça?

vá vá

pisem na pedra

me pulem
distância

onde

estando estando

rodo

aqui

       sempre

       aqui

diz tanto
que a tristeza
seja
sem agonia

por que
o triz teso
se jazem
agorinhas
?