quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Alunos desinteressados contam com nova aliada: a tecnologia





Do uso dos computadores pesados de baú até os mais compactos eletrônicos conectados à internet, cresceu o número de crianças e jovens com acesso ao mundo virtual. Apontado como grande passo para maior aproximação e interação com os acontecimentos, o computador deixou de ser dividido entre uma turma inteira, para cada aluno tê-lo, não somente em suas mãos como também em seus bolsos. Em outra época a patota dos mais dispersos arriscava ser vista e chamada a atenção para matar aula e gozar de um jogo de futebol no campinho próximo. Hoje, com os novos celulares e tablets ligados à grande rede, esse grupo teve o trabalho - às vezes de pular o muro da escola - facilitado por campos abertos extensíssimos, camuflados em um pequeno aparelho.
A educadora e professora de redação Valéria Figueiredo afirma a dificuldade de se reorganizar o ensino: “o professor precisa buscar formação adequada a fim de achar na tecnologia um recurso que lhe facilite a dar conta de prender a atenção do aluno, sem dar margem de se perder nesse abrangente instrumento, e isso tem sido um grande desafio para nós, pois estamos acomodados em antigos modelos de relação ensino-aprendizagem.” Pesquisa realizada pela Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ) revela que falta de interesse pela escola é o principal motivo que leva o brasileiro à evasão: 40% dos jovens de 15 a 17 anos deixam de estudar simplesmente porque acreditam que a escola é desinteressante. “Além disso, há um emaranhado de fatores inibindo a escolaridade como: pouca cobrança, famílias ausentes, facilidade no ingresso ao nível superior, fora conteúdos que não despertam o interesse”, complementa a professora. Isso os deixa propensos a sacar seus smartphones e tablets durante a aula, por trás da carteira ou entre as palmas da mão.
Tempo em que a escrita cursiva (chamada escrita à mão) perdeu a obrigatoriedade, os computadores portáteis avançam ao espaço do lápis e papel. Com várias horas expendidas em chats, crianças cada vez mais novas ganham o costume do “internetês” (língua comumente falada no espaço virtual – com errada grafia e acentuação). Muito mais que uma forma de comunicação e registro, as letras emendadas representam um exercício cerebral. Desenhar as letrinhas trabalha as faculdades cognitivas nos cérebros em formação, as que não o fazem desenvolvem menos as capacidades de memorização, percepção, raciocínio e resolução de problemas.
Mãe de aluna da geração touchscreen - tecnologia sensível ao toque do dedo - Jaciara de Castro admite o poder que essas máquinas exercem na vida dos mais novos, e acredita no controle e dosagem desses apetrechos como as melhores soluções: “A escola precisa impor limite. A aula com internet liberada é de difícil fiscalização por parte do professor, e os estudantes tendem a desviar o foco. As atividades nela conectadas precisam ser com fins determinados e objetivo concreto, necessita-se de supervisão e instrução sobre o conteúdo da atividade pedida”. A mesma diz já ter posto a filha de castigo por notas baixas, fruto de uso exagerado de gadgets. Com 11 anos, Yasmin utiliza tablet, MP4 e smartphone, o único que não é de toque na tela, e leva os 3 todos os dias ao colégio, onde cursa o 6° ano do Ensino Fundamental.
Programas – com apoio do Governo Federal – irão disponibilizar laptops e tablets em escolas da rede pública selecionadas. Com intuito de inclusão digital, os alunos terão contato com a poderosa ferramenta; fica a dúvida se o corpo docente das escolas estará preparado a não só manusear, como guiar sem deixá-los à mercê do bombardeamento de informação superficial.
Precisa-se reformular a didática no magistério brasileiro, ter os olhos atentos ao método dos que transmitem o conhecimento ao invés de na tecnologia, para que o futuro do país não fique a deus dará em frente a uma tela com tantos caminhos também não construtivos.
A socióloga Neuzice Andrade explica: “a Sociedade e a Instituição Escola – parte fundamental do aparato cultural de formação do sujeito - ao lado de outras como a Família e a Religião têm perdido seus papeis como entidades formadoras. Com suas posições enfraquecidas, logo sem um direcionamento, a construção da subjetividade da criança fica vulnerável a qualquer influência. As lacunas do afeto e da lei (limite) em sua constituição simbólica tendem a ser preenchidas por desejos e projetos de vida que a mídia lhes joga – o que se vê é a própria a bascular sem saber explorar, mas sendo conduzida”.
A máquina e a pluralidade de informações não devem ser bicho de sete cabeças, desde que exista um acompanhamento por mãos capacitadas em passar o conteúdo via multimídia. Exemplo de caminho construtivo, a professora Valéria usa a popularidade das redes sociais para publicar redações de alunos e campanhas em prol da língua portuguesa. “Sinto que eles se motivam”, conta a educadora. Como dizia Paulo Freire: “ser educador significa ser ele próprio um permanente educando”. Com monitoramento inadequado, a criança sem iluminação em sua trajetória de estudante transformou a panaceia maquinada da Era onipresente em uma grande parceira de horário vago.

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